sexta-feira, 19 de maio de 2017

O brasileiro come mal




A operação Carne Fraca que revelou o escandaloso caso de venda de carne vencida e adulterada por parte de grandes frigoríficos do país como a JBS e a BRF, deixou muita gente chocada e também abriu margem para reflexões mais profundas; estamos vivendo em uma sociedade que cada vez mais pensa no indivíduo em detrimento da coletividade.

Emprestando o termo do cartunista André Dahmer: Estava eu “navegando pelos agitados mares do Facebook” pós escândalo e tive o desprazer de me deparar com discussões totalmente egoístas e fora de foco diante de um problema que é de saúde pública.

O vegetariano que se vangloria por não consumir carne, mais instruído que o restante da população mundial, avisou. Ao passo que o consumidor de carne, sentindo-se lesado e com o sintoma de raiva constante, típica do brasileiro, afirma que o vegetariano se alimenta de agrotóxico sem ao menos provar o sabor da picanha.

Consumidores passivos que somos, não questionamos o que levamos à mesa e o ápice do nosso “questionamento” é acabar pagando mais caro para comer menos pior.

Em uma matéria publicada pelo Canal IBase, o Fórum de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN), afirmou que o nosso modelo de abastecimento, cada vez mais controlado pelo agronegócio, pela indústria e cadeia de supermercados, acelera o processo de ‘commoditização’ e artificialização dos alimentos, de empobrecimento da base alimentar e no aumento do preço dos alimentos, o que me parece óbvio. O mais assustador é sermos um dos gigantes mundiais na produção agroindustrial e consumirmos um milho que é transgênico. Nosso café, de alta qualidade, é exportado e volta para nós em forma de Starbucks, extremamente caro.

É inaceitável o país liderar o ranking do consumo de agrotóxicos. Em contrapasso, o consumo do orgânico, enquanto opção, é extremamente difícil por conta da lei fundamental da oferta e da procura, afinal de contas ele não é produzido em larga escala, já que sem os fungicidas a produção estraga mais rápido e acabaria gerando prejuízo. No atual contexto, o pequeno produtor de orgânicos não tem oportunidade de crescer porque é esmagado.

Quando esse produtor vende o orgânico para um supermercado, por exemplo, o preço vai às alturas. As empresas jogam 200% de lucro e, claro que esse dinheiro não vai para o agricultor, tampouco o produto vai para a mesa do pobre.

Para quem mora no interior é mais fácil consumir direto do pequeno produtor, sem intermediários, ainda que por um preço um pouco mais caro que o do produto convencional, mas em um grande centro é bem mais complicado.

Como se não bastasse, temos que ouvir declarações como a da senadora Kátia Abreu, da bancada ruralista de que o pobre precisa comer sim comida com agrotóxico porque é mais barato. Como se não bastasse temos uma classe alta extremamente egoísta o que não é bem uma novidade, e uma classe média revanchista nível fundamental que se acha rica quando paga mais caro por “comida saudável”. Como se não bastasse o pobre, com seis bocas para alimentar, precisa comprar o embutido mais barato com retalhos de carne “mecanicamente separada” entre outros subprodutos que chegam às mesas do consumidor final totalmente mascarados.

O que cabe discutir, pelo menos agora, já que a questão chegou escancarada no nosso próprio prato e não vemos muito para onde correr, é uma mudança cultural. Ao invés de debates utópicos como o não abate de animais, deveriam estar em pauta questões como a slowfood e a permacultura, por exemplo, isso para não entrar no mérito da desigualdade social.

0 comentários:

Postar um comentário